08 novembro 2006

reflexões da paixão fria

A dor da rejeição e o avesso do avesso
estão presentes em...

reflexões da paixão fria

um drama que pode acontecer nas melhores famílias.
(para minissérie ou cinema)

No Rio de Janeiro, em 1986, no velório de Jacinto Barromeu Chagas, dono da De Chabot, maior indústria de perfumes e cosméticos do país, a viúva e seus herdeiros se surpreendem com a chegada da ex-cozinheira da mansão, Maria das Dores Afonso, moradora de uma biboca alugada numa favela de São João de Meriti, que traz consigo o filho único, Justino Afonso, que, aos oito anos, veio se despedir do pai que não conheceu.

Francesa que deu três filhos ao falecido, discretamente, Charlot de Chabot Chagas convida-os a sair da capela e os destrata, garantindo que Maria das Dores e seu rebento jamais terão um níquel que fora do industrial, alegando que o ajudou a subir na vida e, em 1956, a criar a De Chabot, um império que leva o nome de sua família de origem. Jean Paul, Maurice e Simone, herdeiros da megera, que estão com vinte e quatro, vinte, e dezenove anos, também não aceitam o irmão que sempre quis conhecê-los, e o humilham, fazendo comentários grosseiros sobre suas vestes, seu mau cheiro e sua feiura, afirmando que a criança só pode ser filho de um E.T., zombando, covardemente. Justino sente-se menosprezado por sua condição social, e tem os primeiros berros da alma, ocultos.

Para que os filhos possam estudar e se transformar em químicos tão brilhantes quanto fora o pai, Charlot assume os negócios e torna-se uma executiva de destacável sucesso, uma dama de ferro que contrata um assassino para eliminar Maria Das Dores e o bastardo.

A mãe morre atropelada, e Justino fica sozinho, pobre, despejado e abandonado. A temida matriarca, Jean e Maurice decidem encaminhá-lo pra uma instituição para menores carentes, mas o órfão foge e passa a viver nas ruas da Zona Sul, onde faz muitos amigos, porém, ninguém acredita que o contador de histórias seja quem diz.

Sem sossego, Charlot contrata um detetive pra descobrir seu paradeiro, mas, o fedelho é espertíssimo e adota o apelido de Lelé, e, pela primeira vez, jura vingar-se dos De Chabot Chagas.

Apesar da precocidade, em meados de 1989, Lelé se vicia em cola de sapateiro e maconha, e passa a andar com uma roda de rapazes maiores de dezoito anos, pedófilos que, por diversas vezes, abusam sexualmente do menino, que cria valores confusos.

Aos treze, ao ganhar ares de homenzinho, em plena luz do sol, Lelé se prostitui com moradores, turistas, freqüentadores da Praia de Copacabana e aliciadores incógnitos que lhe apresentam a cocaína e, posteriormente, o levam a ambientar à cena da noite mundana.

Aos catorze, escondido debaixo de um carro, Lelé assiste ao assassinato de Nicola, colega de mesmo tope com o qual tinha semelhança e que tem o rosto deformado pelos tiros que tomou enquanto dormia. Ele diz à polícia que o morto se chamava Justino Afonso. O extermínio do menor é divulgado nos jornais, e a família De Chabot Chagas acredita que, enfim, está livre daquele que, no futuro, poderia reclamar os seus direitos.

Em quinze de janeiro de 1993, dia em que completa quinze anos, Lelé conhece Irene Barcelos de Magalhães, uma ex-vedete esquecida pela mídia, a quem se apresenta como Nicola, e com quem acaba se envolvendo e criando uma bonita relação de amor, amizade e respeito, e a generosidade mútua é a base deste encontro. Idosa, ela é uma mulher para quem o tempo de fama como Suzete Paris foi efêmero e só deixou o triste pó da lembrança. Sem parentes, pra não passar, sozinha, os últimos anos numa cobertura que mais lhe parece um mausoléu, ela o adota e registra-o como Nicolau Barcelos de Magalhães, e o apresenta a todos como um filho que morava na África do Sul com o pai. Justino tem a chance de estudar e jura, mais uma vez, vingar-se dos De Chabot Chagas.

Com o falecimento de Charlot, em oito de maio de 1994, no Dia das Mães, um novo ciclo se inicia para Jean, Maurice e Simone, que sempre tiveram tudo nas mãos e nunca fizeram nada pra ganhar algum com o próprio esforço, que abandonaram os estudos e não sabem administrar nem um jantar, quanto mais uma empresa.

De posse da volumosa fortuna, em menos de um ano, os três gastam demais e vão à bancarrota, e, pra não decretar falência total, se desfazem das duas mansões, a do Joá, onde moram desde a morte de Jacinto Barromeu Chagas, e a do Recreio dos Bandeirantes, e, em dezembro de 1995, eles põe a De Chabot à venda, mas ninguém se interessa em comprá-la.

1996: Irene, que há anos convivia com um câncer, morre de falência múltipla dos órgãos e, novamente, Justino se vê solitário no mundo, mas, desta vez, riquíssimo, pois se torna o único proprietário dos presentinhos que a ex-vedete, que não mereceu nem uma notinha fúnebre no jornal, recebera dos admiradores da época de ouro: são obras de artes valorosíssimas, terrenos por toda a Cidade Maravilhosa, cinqüenta e três coberturas espalhadas pela Zona Sul, e outros investimentos que a falecida aprendeu a manejar. Que triste pó da lembrança bom, hein! Não é, não? Eta mulherzinha requisitada, essa Suzete Paris!

Representado pelo advogado Randolfo Otílio Parente, por um preço módico, Nicolau compra a De Chabot, uma massa falida a qual pretende transformar, de novo, em uma grande companhia.

Em 2000, Simone casa com Ednaldo da Cunha Bastos, operário da sua confecção, e passa a assinar Simone de Chabot Chagas da Cunha Bastos, e dá luz linda pequena a qual batiza de Monique, em homenagem a sua avó.

Em 2006, ano em que a De Chabot bate recorde de vendas no mercado estrangeiro, Jean Paul de Chabot Chagas tem quarenta e quatro anos e, desde 1994, é casado com Angelina, com quem tem um filho de doze anos. Atrevida, ela vive exigindo uma vida melhor, chamando-o de fracassado e reclamando por ele ter vendido sua fonte de riqueza.

Para Jean, depois de tantas compras em Miami e luxos desnecessários na Europa, sobrou ser professor de informática no curso onde ele aprendeu o ofício, e o salário só dá pra acertar o condomínio da cobertura onde mora, na Vieira Souto, seu único bem imóvel.

Numa das coberturas mais antigas da Atlântica, Maurice de Chabot Chagas, gay de quarenta que só assumiu a sua preferência sexual aos vinte e nove, após à morte de Charlot, a fera que comprava briga até com o diabo, mora com Silvester, seu bofe, sua razão, sua paixão, que tem vinte anos e adora andar de bicicleta, de skate, de surfar, de vadiar...

Para Maurice, que sempre odiou a classe média, depois de exacerbados gastos com festas faraônicas e viagens por todo o Brasil, empreendimentos sem retorno e amores de alto custeio financeiro, restou sobreviver do pouco lucro do restaurante que comprou no segundo andar de um prédio da Visconde de Pirajá, onde, sem que perceba, às vezes é lesado por seus funcionários.

Simone já está com trinta e nove; Ednaldo, só vinte e oito. Eles moram no Leblon e esperam por mais um descendente. Modelo fotográfico, ele faz sucesso com as mulheres, o que a deixa possessa consigo mesma, pois foi ela quem o ajudou a alavancar na carreira.

Nicolau é um dos industriais mais bem sucedidos do país, mas não gosta de badalações, não gosta de ser fotografado e nem gosta de dar entrevistas, vive cercado apenas por alguns empregados de uso geral, e seu rosto só é conhecido por seus advogados e por quem tem o privilégio de conviver com ele na Ilha de São Tomás das Castanhas, propriedade que comprou do ex-governador Romeu Gonzaga Filho, que foi preso por uma série de acusações, entre elas associação com o tráfico de drogas.

Perdulários, os De Chabot Chagas estão endividados até o pescoço, devendo até a quem tem menos do que eles, mas se julgam felizes por terem encontrado sua cara-metade. Angelina, Silvester e Ednaldo são mais do que coadjuvantes, eles são o sal que impulsiona Jean Paul, Maurice e Simone a viver, já que os três irmãos são extremamente passionais.

Aos trinta anos, Angelina Passos de Chabot Chagas, filha de Ângelo Ramos Passos, dono de uma das mais conceituadas empresas de construção civil, é uma mulher futilíssima, e já que Jean não progride e não pode lhe bancar, ela ainda depende do pai, que sustém também a outro peso pesado, o complicado Antoine Passos de Chabot Chagas, seu neto, um faminto que só pensa em comer e tem quarenta quilos a mais do que o normal.

Seduzido pela vida fácil, pra viver como garoto de programa numa quitinete da Francisco Otaviano, aos dezenove, Silvester deixou a casa dos pais, em Oswaldo Cruz. Logo conheceu Maurice, que gamou pelo vadio, o convenceu a abandonar a prostituição e a morar na Atlântica, com direito a uma mesada cinco vezes maior do que ele faturava. Hoje, o indolente se sente cerceado pelo mantenedor, que é possessivo e tão perigoso quanto fora Charlot de Chabot Chagas, capaz de cometer um crime para não perdê-lo.

Ednaldo nunca amou Simone, apenas aproveitou-se de sua paixão arrebatadora para alcançar a fama e ascender de nível social; entretanto, mesmo pensando em se separar dela, evita que a mesma saiba de seus mil e um romances com mulheres belíssimas e mais novas, pois esta descoberta lhe privaria de viver bem, sem ter que tirar do próprio bolso. Inescrupuloso, Ed Bastos, que já está ficando velho para profissão que abraçou, almeja ser ator da Rede Fatos Rio-TV, emissora que mais investe em novelas e minisséries, e é capaz de tudo pra concretizar seu objetivo. Tudo, neste caso, está apenas por começar.

Na academia de ginástica, onde faz de um tudo pra manter o corpinho sarado, Angelina conhece Zé Pedro, um potiguar deslumbrante e pouco mais jovem que ela. Bonito, charmoso e solteiro, porém um pouco bronco, ele é feirante e, por coincidência, tem uma barraca de frutas na feira do bairro, bem próximo à rua dela.

E já que Ed Bastos já tem condições de amparar sua prole, grávida e estressada, Simone decide passar a confecção. Novamente representado por Randolfo Otílio, Nicolau a compra e a doa pra dona Chiquinha do Norte, uma senhora ímpar, do Pará, que vive como mãe de rua e que tanto lhe ajudou na desdita. Juntos, eles dão emprego a um bando de gente que vivia na grama do Aterro do Flamengo, onde, na época cinzenta, ela cansou de catar papelão pra protegê-lo do frio do inverno.

Na Praia do Diabo, no dia do seu aniversário, Silvester da Silveira Bonfim, filho de uma costureira e de um taxista do subúrbio carioca, rapaz que não desmunheca, mas que, desde mocinho, a despeito do desconhecimento dos pais, tem convicção de sua inegável preferência pelo sexo masculino, é apresentado a Casimiro Bueno, ou Miro, que é uns cinco anos mais velho e que sabe tudo do surf, um fera que na verdade é um notável michê, e que, não por acaso, mora sozinho e o faz admirá-lo assim que o conhece, levando-o a refletir que, sem a perseguição de Maurice de Chabot Chagas, a vida poderia ser pra lá de melhor.

Numa exposição de fotografias, ao ser esbarrado de propósito por um desconhecido, Ednaldo tem contanto com aquele que mudará a sua história. Ele percebe o interesse do desastrado e tenta recuar, já que macho não é sua praia, mas acaba lhe dando corda quando ouve dizer que se trata do produtor Diamantino Vilela, um dos maiores amigos pessoais de Renoir Fragoso de Mello, o dono da rede de televisão onde quer trabalhar.

Aqui se faz, aqui se paga, diz o lema da justiça cristã, que, para alguns, certas horas tem sabor de vingança, nem que seja só pra ver o soberano dar bom dia ao plebeu. E assim está montada a derrocada dos De Chabot Chagas, pois o coração é o ponto fraco dos três, que nunca souberam amar e não são amados, dados a exageros desde bebês, por terem sido criados com mimos que lhes permitiram ver o mundo de uma ótica egoísta e fantasiosa.

Amiúde, Silvester passa a aparecer no privê do impecável Casimiro Bueno, que, pra receber um cliente especial, que paga caro e não pode esperar, sempre o despacha.

Encantadíssima com o tipo varonil, Angelina vai à feira, flerta com Zé Pedro e faz compras em sua barraca. Eles saem pra tomar um refrigerante e marcam de almoçar juntos no final de semana, mas bastam dois para que estejam um nos braços do outro.

Mosca de padaria, Ednaldo não perde tempo e vira a sombra de Diamantino Vilela, principalmente, na hora do almoço e do jantar, em que tem a oportunidade de experimentar os mais variados cardápios dos melhores chefes de cozinha do Rio de Janeiro, e de se insinuar pra todo o tipo de proposta indecente que o produtor possa lhe fazer, contanto que ganhe um bom papel na Fatos Rio-TV, emissora dos sonhos de qualquer celebridade. Dando-se conta da criatura reles que ele é, Diamantino propõe que o modelo se livre da mulher e lhe sirva de mulher todos os dias, às seis da tarde, durante dois meses. Prontamente, o aspirante a ator se entrega e acaba gostando do babado, necessitando da coisa e procurando novos parceiros, e deixa Simone de Chabot Chagas da Cunha Bastos. Como prometeu o produtor, Ed é escalado pra protagonizar Espelho Meu, de Tom Maria, substituindo Hélio Quintino, o ator que, por conta da Síndrome do Pânico, confinou-se na Ilha de São Tomás das Castanhas e desistiu de viver o mineiro Túlio da Hora, um personagem exemplar.

Embasbacada, a ambiciosa Angelina se sente ensejada a abandonar Jean, já que, além de mais novo e mais disposto, em dias, o potiguar arruma mais do que professor arruma por mês.

Com a desculpa que quer retomar a vida que levava, vendendo o corpo, porém, liberto pra decidir que caminho deseja trilhar, pois, nos últimos dois anos, sentiu-se mais filho do que caso de Maurice, algoz de seu livre-arbítrio, Silvester deseja morar com Miro. No fundo, o leviano está acometido de repentino fogo de ir pra cama com o novo amigo.

Nicolau inaugura uma fábrica de brinquedos e material escolar em sociedade com Alípio, ou Pentelho, seu melhor amigo desde a época em que vivia nas ruas, não tinha nada e não era ninguém.

Decepcionada com a opção do cônjuge, Simone fica arrasada e procura Diamantino, que diz que não é viado e que nem conhece seu marido. Ela não acredita e passa a agredir Monique, a filha de cinco anos, e a desobrigar-se de Pablo, o bebê que está esperando.

Enquanto isso, na quitinete mobiliada que o amante lhe deu para os encontros das seis, Ednaldo age como se não tivesse família, ignorando os rompantes de loucura da esposa. No jornal, ele vê a foto de Diamantino, um sexagenário que pinta os cabelos e que não tem nada haver com o moço de uns trinta anos que, de uma forma galante e calculada, se apresentou como produtor da Fatos e conseguiu converter sua sexualidade, deflorando-o. Na busca de quem é o homem que lhe assediou e lhe garantiu um bom papel na TV, Ed desconfia de que foi vítima de uma trama ardilosa de alguém que não quer se mostrar; mas, como foi o mais beneficiado neste enredo enigmático, acaba desistindo de procurá-lo.

Silvester revela o tesão que tem por Miro, que deixa claro que ama as mulheres e que não há de sentir mais que amizade por ele; mas, como tudo na vida há de ter um "mas", o interesseiro propõe praticar o coito por dinheiro, já que esta é sua elementar fonte de sobrevivência e, deste jeito, o jovem iniciante pode experimentar a rigidez de seu corpo e não se arrepender do que não viveu. Para tanto, ensejando-o a extorquir Maurice, exige um adiantamento pra se divertirem sempre que puder, e assevera que só desempenha a função ativa e que não gosta de ter contato com homens com excesso de pêlos. Contundido pela rejeição, e jurando que vai lhe bancar enquanto paixão lhe tiver, na mesma hora, o idiota pede um aparelho de barbear e, na frente do astuto, se despe como um striper, senta, cruza as pernas como uma bailarina e as raspa, depois as axilas, antebraços, peito e partes íntimas, fazendo do rompante uma prova de amor lasciva que, intimamente, regozija a mente perversa de Casimiro Bueno, objeto de seu desejo que mal lhe mostrou quem é. Eles tomam uma ducha e, depois de calorosos beijos, têm a primeira noite de amor.

Às seis da manhã, quando Silvester chega em casa, Maurice faz um escarcéu porque ele não lhe avisou que passaria a noite na rua, e mais descontrolado fica quando descobre que seu peludão se raspou todinho, pois ele adora pêlos. Durante uma semana e meia, o casal fica estremecido e não troca uma palavra, mas, nem por isso, o empresário deixa de notar que o garotão está com uma estranha fixação de passar gilete no corpo.

Jean recebe uma carta anônima e toma conhecimento de que Angelina tem outro, um potiguar que trabalha em feiras do Rio e está voltando pra sua terra natal, onde comprou uma fazenda e pretende viver da exportação de uma agricultura planejada. Ele se sente o pior dos homens, entra em depressão, deixa de ir ao curso onde leciona e é despedido.

Através do ingênuo Silvester, Casimiro acumula bens que antes não tinha, pois, a cada ida do mancebo ao cochicholo, um novo presente ele exige, senão, não deixará mais o tolo se divertir com seus dotes, nem lhe dará beijos ardentes pra que se sinta aceito, afagado e amado, como qualquer cliente que ali freqüente e pague bem. Um computador indiscritível, um estrondoso aparelho de som de última geração, uma TV de plasma incomensurável, uma geladeira e um fogão novos, paredes espelhadas, teto rebaixado, ar-condicionado central, cozinha americana e outras obrinhas que jamais poderia bancar, Silvester paga com as coisas de valor que tira da residência de Maurice, peças que vende a preço de banana, só pra ter uma hora marcada na agenda do atarefado varão, só pra ter exclusividade com seu herói dissimulado, só pra cobrir os altos lances que, dia a dia, o explorador impõe ao jogo, como um experiente leiloeiro de si mesmo.

Num bar da Prado Júnior, Jean Paul conhece Guilherme Souto, um trambiqueiro conhecido por Índio, que vende drogas na pista, que já pegou cadeia e que diz levar as mulheres na rédea curta, e que acaba sendo um conselheiro inconveniente, que desperta a estupidez do primogênito dos De Chabot Chagas e o faz agredir a esposa; e esta é a gota d’água para que Angelina parta para o litigioso. Inspirada por Zé Pedro, ela vai em busca da felicidade a dois, e como a justiça há tempos e tempos é cega, o meritíssimo decide que Antoine ficará sob a custódia de Jean, tendo em vista que, por mais que tenha sido violentada pelo marido traído, a mãe abandonou o lar para viver uma aventura, até que se prove o contrário.

Em Botafogo, na Confecção Chiquinha do Norte, o industrial reconhece Ronaldo, o motorista da empresa, o mesmo homem que atropelou Das Dores. Nicolau não revela que é Justino, filho da mulher que ele matou, nem o denuncia, adotando perigosa estratégia. Para ter o assassino nas mãos, contrata-o para trabalhar com ele, na sede da De Chabot.

No dia a dia, Angelina se dá conta que o novo companheiro é alguém misterioso e mais rico do que contou, pois não pára na fazenda, vive viajando em seu avião particular, e não é capiau como demonstrou à primeira vista, quando se fez passar por um atlético bocó.

Incrementando o folhetim do horário nobre, Maurice dá por falta de cinco mil dólares, de algumas jóias que pertenceram à matriarca, de seis telas autênticas de pintores famosos que ele guardava num armário da biblioteca, de dois candelabros de prata e um aparelho de jantar completo, relíquias do século XIV, anterior ao descobrimento do Brasil, com legítima porcelana portuguesa e detalhes dos talheres banhados a ouro, peças virgens que, quem conhece o valor, obviamente só venderia por milhões de reais. Desconfiado de que o caso é de dependência química, quando o gatuno vai pra rua, ele o segue e o vê entrar num edifício da Figueiredo Magalhães.

Ao investigar qual o apartamento que o rapaz visita, o porteiro fofoqueiro revela que, todos os dias, o sacana freqüenta o privê de Casimiro, um inquilino que diz ser professor de matemática, mas que todos no prédio sabem que a matemática do embusteiro é sexo sem compromisso. Supondo que trata-se de uma agência de programas, o besta crê que o amásio lhe roubou e voltou a se prostituir para comprar o seu barato, e pra subir sem ser anunciado conversa o porteiro, um velhote subornável que aceita a molhadura, mas que, assim que o enfurecido entra no elevador principal, interfona e avisa que ele está subindo. Miro manda o novo cliente vestir-se e aguardar seu provedor no corredor, e, a fim de manter o motivo do encontro em segredo, orienta-o a dizer que esteve ali para encomendar drogas, da mais leve à mais pesada.

Assim feito, convencido de que sua paixão não está mentindo, Maurice diz que percebeu que ele tem andado distraído demais pro seu gosto, mas, não deixa de questionar porque todos os dias ele tem que ir ao apartamento de Casimiro, já que pode consumir em casa. Inocente, o quarentão não se dá conta de que está sendo descartado pelo coração do amado, o maior dos beócios, que está amando um desconhecido sedutor cujo passado é sombrio.

Após um parto prematuro e complicado, em que dá luz a um pimpolho tão lindo quanto sua filha, Simone fica entre a vida e a morte. Apesar de ter sido maltratada por ela, Monique tem medo de perdê-la, pois o pai não está nem aí pra sua existência.

Após a transa, Miro diz a Silvester que sabe que ele é viciado em cocaína, e revela que já viveu esse drama e que só se livrou quando encontrou uma mulher extraordinária, que o levou pra uma clínica de recuperação responsável, onde foi assistido por profissionais que, com inúmeras terapias, o desintoxicaram e o ensinaram a não depender mais delas. Aproveitando a deixa, o michê conta que vai pra Europa com seu cliente especial, e propõe que o cacho de Maurice subloque o apartamento por um preço exorbitante.

Silvester confessa a Maurice que se sente castrado por seu amor doentio, tolhido das coisas simples que desde Oswaldo Cruz gosta de fazer, e, para que possa morar só, pede-lhe dinheiro emprestado, pois quer alugar o apartamento de Casimiro, que é muito bem mobiliado. Em um dos prédios mais tradicionais da Avenida Atlântica, o ex-milionário ameaça se jogar da imensa varanda, todavia, o teatro de nada adianta, e, como sempre, ele acaba cedendo à chantagem do adúltero, moço que nunca lhe amou e que agora só pensa em extorqui-lo, mas que sofre pela futura ausência indeterminada do surfista comilão, o locatário do imóvel pra onde quer migrar, propriedade que, ao empresário, o porteiro disse pertencer a um fulano que ninguém nunca viu mais gordo.

Como podemos ver, Ednaldo, Angelina e Silvester, que já eram o sal da vida, transformaram-se também na incurável ferida cravada na alma dos De Chabot Chagas, que, por transtorno emocional, não conseguem conciliar os problemas de âmbito conjugal com a vida profissional, e começam a declinar, satisfazendo ao inimigo oculto, que lhes espreita.

Nesse ínterim, Nicolau Barcelos de Magalhães compra as preciosas mansões que pertenceram à família De Chabot Chagas. A do Recreio dos Bandeirantes, idealizada por Jacinto Barromeu Chagas, por ser uma obra de estilo personalizado, ele usa como residência oficial, e a maior, da Estrada do Joá, encomendada por Madame Charlot, transforma na Casa Das Dores, uma instituição de amparo a menores abandonados.

Bicha espalhafatosa, Zen surge no enredo e vira amigo e confidente de Maurice, e, por incrível que pareça, sempre aparece na hora certa. Rascante, Zen adora cantar down em mim quando o empresário está na deprê, e, de leve, sugere que ele libere a loucura e faça mais companhia a Silvester, consumindo cocaína.

Vítima de eclampsia, rápido, Simone se recupera, mas apresenta problemas na fala, seqüelas que os médicos acreditam que vá durar pro resto de sua vida, e ela afunda de vez. Mas, ao ver que a paciente ojeriza seu neném e evita amamentá-lo, o enfermeiro Gabriel acaba ouvindo o seu drama e a faz não rejeitar o filho por compensação das angústias, pois o pequeno Pablo não tem culpa pelos passos errados de Ed, e ela precisa vencer o caos. Sugere, também, que se reaproxime da filha, faça as pazes e a abrace forte, e a acostume a gostar do irmão desde já, para que Monique não venha a ter ciúme, inveja ou rejeição.

Longe da amada Angelina, Jean Paul se enrola com o orçamento doméstico e não consegue saldar uma série de dívidas, tem que vender o carro e sua cobertura é hipotecada. Alcoolizado, toda vez que vem da fossa, o corno covarde bate em Antoine, adolescente que tem dificuldades pra se locomover, devido à obesidade exagerada, quase mórbida, e chama-o de leitão inútil, humilhando-o como fez com Justino, seu irmão.

Como a vida é curta e os espertos vivem dos trouxas, aceitando o conselho de Zen e achando que assim pode reconquistar Silvester, o empresário compra uma carga de pó e conta pro viciado que também está curtindo se drogar, e quando Casimiro parte para Barcelona, a primeira cidade em que o seu cliente especial quer se hospedar, o manteúdo lhe convida para consumirem o entorpecente em sua nova morada.

Maurice fica impressionado com o enxame de aparelhos de tecnologia de ponta que o falso professor tem em casa, e deduz que ele pertence a uma quadrilha internacional e, certamente, viajou pra traficar narcóticos. Enquanto o bofe cheira todas, ele se desaponta por não encontrar nenhuma fotografia, nenhum bilhete, nenhum documento, nada de pessoal que lhe dê pistas da origem ou da real ocupação do indesejado suspeito.

Cansado de apanhar, Antoine foge de casa e vai viver nas ruas, onde uma senhora gorda e um bando de pivetes lhe tomam o dinheiro, a mochila, a camisa, a bermuda, o tênis, o relógio, e o deixam só de cueca. Ele senta na areia da praia e chora, copiosamente; adormece e só acorda no meio da noite, quando o frio mostra o quanto faz falta uma roupa, uma cama, um cobertor, uma boa comida, uma casa pra morar, pai e mãe...

Enquanto dorme, Silvester fala o nome de Miro de forma sensual, repetidas vezes, e geme com tranqüilidade, como se estivesse em contato carnal com o garanhão. Ao seu lado, Maurice tem ódio de vê-lo lânguido como fêmea, murmurando por um possível traficante. Acorda-o com uma série de bolachas e cobra explicações, mas o sonhador foge do assunto.

Numa conversa informal, Ronaldo confessa ao patrão que, antes de trabalhar pra Simone, fazia alguns serviços pessoais pra Charlot, de quem foi amante até sua morte. Nicolau conclui que foi a matriarca dos De Chabot Chagas quem encomendou a morte de sua mãe.

Querendo um ouvido que escute suas mágoas, Jean Paul dá por falta do filho, mas, bêbado, acaba achando que Antoine está se escondendo e não dá importância a seu sumiço, e, com o passar dos dias, até se esquece que o rolha-de-poço existe.

Três semanas depois, milagrosamente, Simone se restabelece totalmente, inclusive da paixão por Ed, pois se julga apaixonada por Gabriel, a quem diz ser um anjo e agradece por ter-lhe feito companhia no período de convalescença, mas, o indivíduo de bela compleição diz não ter permissão de Deus pra se envolver com ela, pois eles não podem ser mais que irmãos.
- Como assim? - pergunta a recusada, doida por um beijo na boca.
- Você não diz que eu sou um anjo? - disfarça ele: - Anjos são irmãos de todos.
Simone acredita que Gabriel seja homossexual, assim como Ed Bastos se revelou, e deixa de investir, acreditando que, se o enfermeiro já fez a sua opção, não adianta insistir. Mas, cria laços de amizade e quer apresentá-lo aos irmãos, mas ele está sempre de plantão.

Já com uns trapos que, solidariamente, um velho indigente lhe arrumou, Antoine, molecote gordão que ninguém acredita que possa estar passando fome, está mendigando algum dinheiro numa lanchonete do Leblon, perto da cobertura da tia Simone, antipática que o chama de Bujão de Ipanema, sem escolher hora ou lugar convenientes, na frente do seu pai, da sua mãe, do seu avô, dos vizinhos ou de quem quer que seja.
- Não é o filho de Angelina e Jean Paul? – questiona uma amiga do casal.
- Não. – afirma a outra: - O Bujão de Ipanema não andaria sujo e mal vestido assim. Esse descabelado é moleque de rua, e se conhecesse o herdeiro de Ângelo Ramos Passos, devido à semelhança, talvez os dois pudessem encarnar o clássico O Príncipe e o Mendigo.
- Eu soube que a mãe foi viver com outro, e que o pai danou a beber, largou o emprego e se afundou de vez. Isso pode mudar a história de um homem.
- Apesar dos pesares, Ângelo Ramos Passos é um dos mais consagrados em seu ramo de atividade, e jamais deixaria seu único neto viver uma pindaíba desta; esse maltrapilho não é quem você pensa.
Cecílio Lopes, um antiquário das redondezas, se comove com o drama do rapazelho e o faz sentar com ele, e paga-lhe um lanche sem limites de créditos, frisando que é a última vez que Antoine vai se empanturrar com ganância, como se estivesse comendo pra estocar.
- Porquê diz isso? – desconfiado de que é tráfico, o fugitivo indaga: - O senhor tá me alimentando pra depois tirar meu fígado, meus rins e meu coração?
- Seu coração – responde o milionário: - só caberia numa baleia.
- Deve ser um pedófilo. – cochicha uma das senhoras, ao vê-los conversar.
- Não duvido. – diz a outra: - Os homens de terno são os mais depravados.

Cecílio, que ao que tudo indica é um ser humano altruísta, o leva pra sua mansão no Recreio dos Bandeirantes e lhe aprisiona, contudo, lhe dá um tratamento que só se dá a um filho muito estimado, montando um consultório médico em um dos imensos cômodos da propriedade e contratando uma cardiologista, um pediatra, uma psicóloga, três professores de ginástica, natação e musculação, um clínico geral, uma nutricionista e Alda Virgínia, uma secretária gostosona pra organizar a agenda de Antoine, que se sente querido e esquece até que tem família, e pede para chamá-lo de pai; mas, o rapaz diz que prefere ser só seu tio.

Maurice descobre que o ímovel em que Silvestesr mora pertence a Nicolau Barcelos de Magalhães, que nunca visitou o apartamento.
- Eu já ouvi esse nome em algum lugar. – pensa o desavisado.
Em visita remunerada ao síndico, ele obtém o número do celular do seu Nicola, e, por telefone, friamente, sem refletir o ato descomedido a que a paixão está lhe conduzindo, tenta persuadir o proprietário a despejar o seu grande amor, mas tem um não como resposta.

Casimiro manda um cartão-postal de Madri, manifestando a Silvester que, com a distância, reconheceu que o ama e que tem saudade feroz do pouco que viveram, e como seu cliente especial decidiu que eles vão passar um longo tempo em Veneza, em breve, enviará dinheiro para que o rapagão também possa embarcar rumo a uma nova vida.

Com um sorriso corado, a auto-estima refeita e uma caixa de bombons nas mãos, Simone chega à maternidade onde Pablo nasceu e pergunta por Gabriel, seu anjo da guarda. Pelo áudio, a atendente requisita a presença do enfermeiro ao balcão de atendimento, e quando este vem saber porque lhe chamam, a ex-milionária vê que não se trata do amigo com quem tanto conversou, o homem que, com paciência, tentava entender o que ela dizia. O seu Gabriel era branco e tinha 1,75m; este é mulato e é um varapau de quase 1,90m. Sem decifrar o porquê do engodo, ela crê que ele pertença ao mundo invisível, e, atendendo os sensatos conselhos do desconhecido, volta pra casa mais feliz que nunca, abraça Monique e a faz carregar o irmãozinho no colo, se arrependendo, sinceramente.

Mais cedo do que se esperava, Silvester diz a Maurice que entregou o apartamento ao seu Nicola e que está de passagem marcada pra Veneza, onde pretende morar por uns tempos; e, já que coco queimado vira cocada, ele resolve explanar a verdade sobre seu amor por Miro, que está o aguardando e lhe enviou dois mil dólares para entrar no país.

Índio reaparece, conta a Jean Paul que aplicou um grande golpe e diz que, se puder dividir a cobertura da Vieira Souto com ele, está disposto a lhe arrumar a grana da hipoteca. Como está no fundo do poço, o professor aceita a proposta e, legalmente, passa 50% do domicílio pro pirata, que ainda o convence a assinar o divórcio.

Em contrapartida, na fazenda, Angelina se sente desvalida pelo novo companheiro, que, visto que o mundo é feito de patrimônios sólidos e de gente disposta a ter mais do que tem, alega estar ampliando os negócios de exportação e não ter tempo para rocamboles. Carente, ela liga pra Jean e pergunta por Antoine, e o pai, que não vê o pirralho há um mês, diz que o filho está numa colônia de férias, se divertindo e gastando energia como toda criança da sua idade deveria fazer. Ela acredita e, pela primeira vez, sente falta do gordão.

Por sua vez, assistido pela super equipe patrocinada por Cecílio, de fato, Antoine tem queimado bastantes calorias e se alimentado com uma dieta programada à base de frutas, legumes, verduras e filés de peixe, e já perdeu oito quilos em pouco tempo, sem a ajuda dos produtos falazes que o mercado do oportunismo costuma oferecer, como bonificação pelo sucesso, o antiquário diz ao balofo que ele tem direito a uma bola de futebol assinada pelo craque Rafly Guimarães, artilheiro do pentacampeonato, a um computador irado, montado pelas mãos do próprio Bill Gates, e a uma mesa de ping-pong que pertenceu a Dom Pedro II. Achando que é tudo mentira, Antoine agradece e abusa, pedindo o aumento do quadro funcional de apoio persornal, ou seja, alguém que lhe ensine a desenvolver os rabiscos, pois, desde novinho, sempre gostou de desenhar roupas. Orgulhoso do dom que pode tirar o garoto do ostracismo, o ricaço não titubeia e diz que vai contratar o estilista Mago Estorinni, um afeminado que entende dos traços.
- Logo uma bicha, tio? – Antoine empedra: - E se ele me cantar?
- Não tenha preconceitos, meu filho. – elevado, Cecílio orienta ao sobrinho: - Geralmente, gays são bons profissionais em tudo que fazem; cantam, dançam e sapateiam. E pessoas sérias e livres de taras criminosas não são capazes de abusar de um garrote. Aprenda que, pra ser pedófilo, não precisa ser homossexual. Estorinni não vai lhe cantar.
- Você também é bicha?
- Não, e nem pense que eu te acolhi por que estou interessado em sexo.
- Então, cadê tua esposa? Com a tua idade, meu pai já era casado.
- Com toda certeza, seu pai nunca passou pelos conflitos que eu já passei.

No Aeroporto Internacional Tom Jobim, com a alma zangada, Maurice insiste para Silvester desistir da aventura e voltar pros seus braços, garantindo que ninguém o amará tanto, "nem nessa e nem em outra vida", e que Miro é só uma nuvem passageira que não o sustentará da mesma forma. No saguão, a bicha se joga no chão e dá vexame, gritando que quer morrer "aqui e agora", que se suicidará se ele puser os pés no avião, pois, partindo, sua paixão há de partir seu coração; mas, de nada adianta o patético showzinho. Enquanto seguranças e carregadores lhe acodem, como se fosse cego, mudo, surdo e egoísta, vivendo seu primeiro grande amor, o bofe não lhe dá ouvidos, cruza o portão de embarque e entra no vôo que o levará ao encontro de seu adorável prostituto.

A caminho da fábrica de brinquedos, Ronaldo diz que é apreciador de bons vinhos, e o patrão lhe promete uma garrafa de excelente safra. Chegando ao destino, pela janela do escritório, Nicolau mostra o executor de Maria Das Dores a Pentelho, e diz que, em nome da velha amizade, está na hora de ele lhe prestar um pequeno serviço.

Em Veneza, o aventureiro não acha Miro, o biltre que lhe deu um endereço fictício. Sozinho num país distante, seu semblante deixa transparecer a decepção e o desespero, e como se alguém já o tivesse recomendado para o serviço, um rufião o envolve numa trama de lenocínio de imigrantes, levando-o pra Suíça, onde é escravizado por uma impiedosa quadrilha, que o trancafia em um sobrado inóspito e o faz servir a europeus violentos.

Na Ilha de São Tomás das Castanhas, sem fotografias, mas com toda pompa a que o jornalista tem direito, Nicolau concede entrevista a uma revista que faz reportagens com executivos de sucesso. Pela primeira vez, sem cabotinismo, ele conta a sua saga: um ex-menino de rua que hoje é um dos maiores industriais do país e que colabora com os desamparados, sem fazer política. Interrogado sobre sua família, o industrial diz que tem três irmãos, mas não gosta de falar a respeito disso, pois as lembranças que tem deles não lhe reportam a bons sentimentos.

Apresentando os primeiro sintomas de insanidade emocional, parvo, Maurice aceita o conselho de Zen, reúne suas economias e, na esperança de rever Silvester e convencê-lo a voltar, compra uma passagem pra Veneza. Estremecido com Simone há mais de um ano, desde quando ela afirmou que seu garotão não passava de um caça-dotes, e como Jean Paul nunca teve talento pra comandar coisa alguma e está se desgraçando na bebida, ele diz ao amigo que decidiu deixar-lhe administrando o restaurante Gardênia de Ipanema. Para tanto, tem que fazer uma procuração em nome de Guilherme Souto, verdadeira identidade de Zen, que, num ludíbrio mirabolante, o faz assinar o documento onde lhe dá plenos poderes.

Vítima de uma indomável invasão de baratas, Simone conhece Guilherme Souto, dono de uma firma de dedetização. Negro de origem pobre, ele já morou nas ruas, mas não tem nenhuma semelhança física com o vigarista que está levando seus irmãos na lábia. Após eliminar as intrusas do enorme apartamento do Leblon, ele é convidado a tomar um café com a madame, que constata que, além de bonito, o moço sabe conduzir o papo de um jeito educado, inteligente e alegre; e alegria é tudo que ela mais precisa.

Em casa, na Lapa, no dia da sua folga, Ronaldo recebe um Vinho do Porto das mãos de Alípio, que se passa por funcionário da De Chabot e diz que o patrão recomendou para que, assim que o motorista recebesse o presente, tomasse uma dose pra apurar a qualidade e dissesse o que achou. Levando fé que Nicolau Barcelos de Magalhães o tem em alta estima, sorrindo, o matador de Das Dores abre a garrafa, enche um cálice e bebe numa só talagada. Envenenado, ele morre diante dos olhos do entregador, que, com luva cirúrgica, recolhe o flagrante e monta a cena da overdose: abre o saco com vinte gramas de cocaína pura; suja a capa de um livro, o canudo e o nariz do morto com a droga; e sai sem que ninguém o veja.

Com falsa pena de Jean, Índio apresenta Rosineide Souto ao pé-de-cana. Mais elegante, mais jovem e muito mais bonita que Angelina Colla Passos. Irmã do 171, ela é uma mulher esperta, trazida à baila pra aplicar um cambalacho no otário, que aceita seus carinhos, é levado pra cama e, numa brincadeira sem pé, sem cabeça e sem graça, firma sua assinatura em uma folha de ofício em branco, que vira uma ardilosa procuração.

Com o espírito renovado pela esperança, Simone, que só precisa ser amada, que precisa ser feliz, começa a namorar Guilherme Souto e se sente até remoçando, e se pega cantando sem mais nem por quê, e cuida dos filhos com a alegria de uma loba que protege e se orgulha da cria, mãe universal, e nem parece ser a sofrida que foi preterida por Ednaldo. Como a felicidade foi feita pra ser dividida, ela pensa em apresentar seu negão aos irmãos, mas fica depauperada ao saber que Maurice viajou à caça do caça-dotes, e, parecendo que prevê a maré de azar de sua família, teme que ele se atole, como fez Jean, um pinguço que, com todas vírgulas, pontos e reticências, envergonharia Jacinto e Charlot.

Em visita ao primogênito dos De Chabot Chagas, ela diz que, se ele se propuser a esquecer Angelina e parar de beber, saldará sua hipoteca. Jean conta que já se livrou deste problema e que tem um sócio, Guilherme Souto, detentor de metade da cobertura.
- Guilherme Souto é o nome do meu namorado. – conta Simone, ressabiada.
- Como é o teu namorado? – ele interpela, pra ver se é o cabra dos golpes.
- Ele tem 1,80m, olhos castanhos, óculos, quarenta anos, é magro e preto.
- Então, - afiança o beberrão: - teu namorado e o Índio jamais
podem ser a mesma pessoa, porque o meu sócio é branco, tem estatura mediana, não usa óculos e tem aproximadente uns trinta anos.
Madrinha de Antoine, a tia bruxa pergunta pelo afilhado, e talvez por ter passado por momentos difíceis, em que o fino laço da vida pode se romper, desta vez, sem chamá-lo de Bujão de Ipanema. Jean mente, dizendo que o sumido está passando uns dias com a mãe, no fazendão que a interesseira foi morar com seu amante potiguar.

Num cartório do Centro do Rio de Janeiro, com a presença dos interessados na burocracia do negócio, o restaurante Gardênia de Ipanema e as coberturas de Jean e de Maurice de Chabot Chagas são comprados pelo industrial Nicolau Barcelos de Magalhães, que brinda com o tabelião Alcione Aragão Santana, grande fã da entupigaitante Suzete Paris, com Almerinda Fonseca, sua secretária, que se fez passar por Rosineide Souto, irmã do Índio, e com o verdadeiro Guilherme Souto, ou Mutuca, amigo a quem, depois de endinheirado, Lelé não esqueceu de estender a mão, e que emprestou-lhe o nome e se viu emaranhado numa intriga diabólica em que acabou se apaixonando por Simone, a deusa a quem não quer ferir.

Ao lerem a reportagem sobre o dono da De Chabot, e saberem que ele foi adotado por uma ex-vedete milionária e que se chama Nicolau, Margarida de Souza Pimenta, a mãe, e Cândido Campos da Silva, padrasto que odiava o trombadinha, procuram o industrial e o chamam de Nicola, achando que pode se tratar de um filho que, em 1990, fugiu de casa. Gente humilde, eles pretendem arrumar algum pra comprar um lar fora da favela, e como a morte de Nicola foi sua grata sorte, pois era a Justino que os verdugos procuravam, ele compra uma casa de dois andares e uma padaria em Madureira para dona Margarida. Entretanto, sabendo que a fuga do falecido amigo se deu devido ao espancamento ao qual Cândido o submetia, a faz assinar um estranho documento sobre o patrimônio que lhe é doado: acaso venha a se casar com o calhorda, perderá os direitos sobre as propriedades. Mãe de cinco filhos, ela topa na hora, e acaba botando o amásio pra correr.

Cecílio joga bola com seu protegido e diz que ele tem o nome de um francês famoso, Antoine de Saint-Exupéry, que era também aviador e que, num vôo sem volta, sumiu em missão de guerra, e cujos restos mortais só foram encontrados recentemente, e que, entre outras histórias, escreveu O Pequeno Príncipe, livro com o qual lhe presenteia. Aproveitando a harmonia, o protetor conta que contratou uma professora de dança.

De ressaca e cheio de olheiras, em um dos bancos de concreto da Praia do Leme, abraçado a uma garrafa de cachaça barata, Jean acorda e acena pra um táxis, que passa por ele e nem lhe dá bola, mas pára mais a frente, pra uma senhora muito bem vestida, bem penteada e com dinheiro, diferente do trapo em que, em meses, ele se transformou. A pés, o mentecapto chega na Avenida Vieira Souto e é informado que o novo dono, senhor Nicolau Barcelos de Magalhães, quer a moradia pra ontem, e ele se dá conta de que foi vítima do Índio, larápio que o passou pra trás, tranqüilamente.

Já que a grana acabou, depois de procurar nos inúmeros hotéis e arredores de Veneza, intrigado com o sumiço de Silvester, fato que, conforme lhe informaram, a polícia italiana só se prontifica a procurar diante de suspeita de seqüestro ou crime político, que devem ser prontamente anunciados pelo consulado, órgão que tem o direito de pedir uma investigação mais formal, Maurice resolve voltar ao Brasil e aguardar notícias em casa.

Conforme reza a cláusula, o empresário tinha quarenta dias pra sair da cobertura, prazo que se esgotou, e é por isso que ele encontra Almerinda arriscando de fiscal de obra, acelerando o quebra-quebra da reforma do imóvel do patrão, um comprador invisível. Pela secretária do milionário, Maurice fica sabendo que ele e o irmão perderam o patrimônio que possuíam, pois Guilherme Souto vendeu as propriedades da sua família.

Com vergonha, ele procura a irmã, faz as pazes, diz que está passando por privações e pede para morar com ela, pois foi depredado por um maldito que se fez de amigo e vendeu todos seus bens para um tal Nicolau Barcelos de Magalhães, um pedante que se recusa a recebê-lo e também é dono do apê de Casimiro Bueno. Simone lembra que Nicolau é o nome do arquimilionário que, há alguns meses, comprou sua confecção por uma pechincha, e, há dez anos, a De Chabot por uma ninharia. Não acreditando em coincidências que só procedem em novelas e humorísticos, a irmã de Justino acha que tem um piolho a mais nessa desgrenhada cabeleira, e sonda se Maurice já teve a oportunidade de estar com o esquisito que vem arrematando tudo que lhes pertenceu. Aproveitando o ensejo, ela o convida para batizar Pablo, já que Jean já é padrinho de Monique, e conta que está completamente apaixonada por um homem negro, jovial e maravilhosamente paciente, que tem lhe feito sorrir outra vez pra vida, Guilherme Souto. Ele diz que este é o nome de Zen, o cara que lhe conduziu à macaca, mas, ao conhecer o namorado de Simone, vê que tudo não passou de um equívoco e pede desculpas.

Ao ver Jean com delirium tremens, Almerinda tem piedade e entende que está caidinha pelo fracassado, e pede ao patrão que o deixe morar na cobertura que lhe pertenceu, pois o pobre andarilho está duro como casco de tartaruga e vive vagando pelas ruas, travessas e avenidas da Zona Sul, esfarrapado por dentro, por fora e no meio da alma, cheirando a porco, tomando porrada de quem tem fobia de mendigos e pedindo aos transeuntes que lhe arrumem algum trocado pra tomar pinga. Por conta da longínqua amizade que tem com a secretária que veio das ruas, Nicolau concede o favor ao seu irmão mais velho, ressalvando que é só até que ele remonte sua saúde física e possa voltar a ser uma peça no seu xadrez.

Dois meses depois...

Das mãos de um aliciador, um cliente penalizado compra o passe de Silvester e o manda de volta ao Brasil. Ao chegar à casa, em Oswaldo Cruz, sua mãe lhe entrega um convite que chegou, pra festança do ano, na De Chabot, e um bilhete de Miro, dizendo que lhe enviará roupas adequadas para a ocasião e que também estará presente.

De Buenos Aires, Ângelo liga pro genro e diz que quer falar com o gordo. Jean Paul inventa que o filho foi estudar na casa de um colega de escola, e, ao desligar, contabiliza que há mais de cinco meses não o vê, mas nem se preocupa em procurá-lo. Debilitado, o ébrio liga pra irmã, conta toda a verdade e também vai morar no Leblon.

Diante do espelho, com a auto-estima às alturas, Antoine se sente uma nova pessoa, dono de uma silhueta e de um brilho pessoal que, em tempo algum, vislumbrou que teria. Cecílio Lopes lhe compra o melhor smoking e diz que vai lhe levar a uma grande comemoração, em que surpresas que jamais ninguém poderia imaginar hão de se realizar.

A família De Chabot Chagas recebe convites para o cinqüentenário da De Chabot. Simone decide que todos três irão a esta festa, pois é a oportunidade de estarem cara a cara com o todo poderoso que, apesar da inestimável opulência, como se guardasse motivos obscuros para arruinar Jean e Maurice, os enredou numa falcatrua que não deixou pistas, pois, ao tabelião Alcione, Nicolau declarou só conhecer Guilherme Souto, o procurador.

Com a morte de Zé, os funcionários da fazenda informam à Angelina que o cabra era só um administrador enviado por Nicolau Barcelos de Magalhães, um sujeito que jamais deu as caras por aquela região, verdadeiro dono daquele paraíso, do avião, dos carros e de tudo mais que, há oito meses, o potiguar dizia ser dele. Revoltada com tanta mentira, ela não tem outra opção, faz as malas e volta pro Rio, onde o pai lhe convida para ir ao aniversário de cinqüenta anos da indústria de um grande amigo.

No gigantesco salão de solenidades da De Chabot, duas mil pessoas aguardam para ver o rosto daquele que ressuscitou o império dilapidado por Jean, Maurice e Simone, que estão entre os presentes e recebem, de um mensageiro particular, um convite para privarem da companhia de Nicolau, no escritório que um dia foi de Jacinto Barromeu Chagas, com direito a champanhe de estirpe que eles há tempos não tomam, e a finalidade de celebrar a nova geração da indústria que foi da família De Chabot Chagas. Simone julga-o um crápula, um sórdido que, para feri-los, elabora frases maquiadas, em que, cinicamente, num simples bilhete, deixa escorrer a mesquinhez, o veneno e o fel; entretanto, sobretudo porque quer saber o porquê de Guilherme, com quem se decepcionou, ter compactuado com o enigmático ser que faz questão de mostrar que gosta de pisá-los, e já que esta foi a razão da ida, imediatamente, topa estar frente a frente com o calculista.

Angelina, acompanhada pelo pai, Ed Bastos, de mãos dadas com Berta Baranda Bastos, atriz exclusiva da Fatos Rio-TV, e Silvester da Silveira Bonfim, o desorientado que procura por Miro, também estão curtindo a boa música, as chatíssimas homenagens de praxe prestadas ao ilustre que não aparece em público, e os comes e bebes. O mesmo senhor pede para que eles o acompanhem até à sala do presidente da companhia.

Ed acha que receberá rasgados elogios por sua atuação em Espelho Meu. Angelina, a viúva que não chegou a ser, como rotularia o inesquecível Dias Gomes, e que procura um bom partido que lhe ampare financeiramente, acredita que sua beleza chamou a atenção do milionário sem rosto e se prepara pro ataque. Caído pelo pilantra que lhe vendeu pros italianos, o coração suburbano de Silvester imagina que o cara seja o cliente especial de Miro, e confia que vai rever seu doce michê.

Entre incontáveis operários da De Chabot e figuras expoentes da sociedade carioca, políticos arroz de festa, artistas da Fatos Rio-TV e de outras emissoras, estão Almerinda, Mutuca, Chiquinha do Norte, Pentelho, Gringolado, Posto 6 e outros que já foram das ruas, cidadãos comuns que foram beneficiados pela compaixão do industrial, o transformador, homem que, pela regeneração dos que não tiveram chances, compra tudo e a todos.

Na sala de Nicolau, a primeira surpresa: Ednaldo, Angelina e Silvester reencontram os De Chabot Chagas, os herdeiros falidos, e a troca de cumprimentos sem paixão pode ser diagnosticada como herança dos sofrimentos, pois a alma corrompida não atina o quanto o vazio pode doer, nem o quanto a solidão é avessa e comum a todos, e todos estão solitários.

Maurice se surpreende, mas não esconde a felicidade ao ver seu belo rapaz, que o repudia, confessando que não está ali pra vê-lo e nem queria tê-lo visto, e que sua presença se dá, única e exclusivamente, pela esperança que tem de se enlaçar com Miro, camarada que tem extremo magnetismo e que não o sufoca. A bicha desmaia. De show, é claro! Contudo, Silvester acende um cigarro e dá uma longa baforada no ar, despreocupado.

Com intenção de despertar ciúme, Jean Paul diz a ex:
- Estou namorando uma secretária executiva e penso em me casar de novo.
- Secretária executiva? – irônica, Angelina aconselha: - Seja mais humilde e se contente com uma empregadinha doméstica, que condiz mais com sua personalidade e com sua conta bancária, se é que você ainda tem uma.
Na frente de todos, ele tenta beijá-la à força.
- Eu não sei viver sem você. – declara o panaca. - Volta pra mim, amor!
Enojada, ela o esbofeteia e afirma:
- Não estou a fim de flash-back com você. Nós só temos um interesse comum, Antoine Passos de Chabot Chagas, o gordo.

Simone não tolera ter que engolir a falta de charme de Ednaldo Bastos, um intragável de carteirinha que, sem um pingo de talento para se firmar nas artes dramáticas, ninguém sabe explicar direito por quê o babaca de crachá se transformou no mocinho das oito, mesmo não passando de um tremendo desajeitado que está afundando a obra inédita de Tom Maria e a audiência do horário nobre da empresa de Renoir.

De curta figuração, o garçom vem à cena para lhes servir os canapés e liga a televisão. Com elenco e produção formados por profissionais gabaritados em documentários, os convivas assistem a dramatização audiovisual da vida de um favelado sem perspectiva de horizontes vindouros, único rebento de Maria das Dores com um renomado fabricante de perfumes e cosméticos, que já tinha três filhos e nunca o reconheceu como herdeiro.
No enterro do pai, personagem que o bastardo só conheceu no caixão, aos oito anos, pela primeira vez o guri tem contato com o fim da vida e com seus irmãos, que sempre desejara conhecer, mas que o repeliram com palavras cruéis, fazendo-o sentir-se o morto, enterrado vivo pelo amor que ele já sentia, massacrado pela falta de reciprocidade.

O filme ganha asas a partir da dor que o pequeno órfão sentiu quando a família de seu genitor tentou lhe jogar numa instituição para menores abandonados, pois, ao perder a mãe e não ser acolhido por eles, ele rumou pro mundo das ruas e, daí por diante, todos ficam sabendo por tudo que Lelé passou, inclusive do trágico fim de Nicola, de quem, para sobreviver nesta ingrata selva de pedra, tomou o nome emprestado; mas todos continuam sem conhecer a fisionomia do invasor que move as peças para o xeque-mate, para a vitória da etopéia, do oblíquo, da linguagem perdida.

Jean Paul não capta o quê está se passando, mas Simone e Maurice entendem que se trata de Justino Afonso, o pulinho de Jacinto Barromeu Chagas com a ex-cozinheira da mansão do Recreio, uma criança que eles humilharam quando eram vinte anos mais jovens.
- Eu pensei que ele tinha morrido. – recalcitra a irmã, pasmada.

Interpretado por vários atores, o menino de rua cumpre sua saga de rancor e glória, uma vida atormentada pela frieza dos seres humanos ruins que encontrou pelo caminho, inimigos que muitas vezes não tiveram um rosto, não tiveram um nome, não tiveram pátria ou endereço fixo, mas, em contraponto, recheada de amigos bons, que lhe mostraram que o sangue está no afeto que se deposita no coração do outro, no companheirismo reflexivo da paixão, sob o sol ou sob as estrelas, observando hipócritas ou junto à fogueirinha de papel.

No intervalo, enquanto uma propaganda mostra as dependências da De Chabot e dos perfumes mais vendidos da marca, o locutor narra o aclamado sucesso que as indústrias do homem do futuro, Nicolau Barcelos de Magalhães, vem fazendo no mercado estrangeiro.

De smoking e com impressionante habilidade pra dança, um belíssimo adolescente de cabelos encaracolados adentra o ambiente frígido onde espectadores bufam; sapateando, o esguio dá seu espetáculo de curta duração e anuncia que seu tio já está por vir.
- Esse bailarino tem a voz de Antoine. – diz Angelina, encafifada.
- Eu nunca vi esse magricela mais gordo. – Jean se permite o comentário: - Ele é um faquir?
- Eu te conheço de algum lugar? – ela pergunta, mas o dançarino se vai.
O garçom traz sorvetes em taças de cristal, cada qual no sabor preferido de cada um, o quê causa surpresa à Simone, que tem o de jaca e lembra que disse a Gabriel qual era o seu predileto, e começa a montar o quebra-cabeça.
- Não podemos ser mais que irmãos. – ela resgata as palavras do enfermeiro.

Voltando a tela, com o rosto borrado digitalmente, Nicolau Barcelos de Magalhães continua sua biografia:
- Os irmãos do moleque Justino se chamam Simone, Maurice e Jean Paul.
- Alguém me chamou? – indaga o bagaceiro, perdido na situação.
- Esta voz é do Zen, o quadrilheiro filho de uma puta! – certifica Maurice.
- Não. É a voz do Miro. – corrige Silvester, sorrindo de ansiedade: - Meu Miro!
- Se fosse mais bronco, - diz Angelina: - eu diria que é do falecido Zé Pedro.
- E se fosse mais lento, - diz Ednaldo: - eu podia jurar que é o Diamantino.

Retornando a simulação, em um megapalco, onze atores caricaturados dão vida aos encontros de Angelina com Zé, de Silvester com seu michê, de Ed Bastos com o produtor, de Jean e Maurice com o trapaceiro Guilherme Souto, e de Simone com o anjo invisível. Tendo o caráter sórdido dos pares como tema, o texto da peça televisionada é revelador e esculachante, enfatizando que, premeditadamente, o ponto fraco de todos foi alvejado. Todavia, supondo que suas vidas foram devassadas por detetives, os comensais se rebelam e juram reivindicar indenizações contra a invasão de privacidade; só Simone desconfia que o potiguar, Casimiro Bueno, Diamantino Vilela, Índio, Zen e Gabriel são a mesma pessoa: Justino Afonso, o herdeiro da vedete, que está se passando por Nicolau, o impiedoso.

Denunciando os crimes cometidos pela morta, Berta Baranda Bastos, atriz que interpreta Simone na fase adulta e que faz questão de frisar que o seu Bastos não tem nada haver com Ed, esplendidamente caracterizada, interpreta a cena em que a inflexível Charlot, aos cinqüenta e sete, encomenda o homicídio de Maria das Dores. Como artifício de ligação entre as partes, conduzindo o veículo e sem saber que estava sendo filmado, Ronaldo confessa que, em troca do atropelamento da ex-conzinheira, ela lhe deu uma casa na Lapa, a alcova chique da viúva de Jacinto Barromeu Chagas e de seu motorista, que antes agia como assassino profissional e que, para achar Justino Afonso e acabar com o pivete, ganhou um prédio comercial de três andares no Centro do Rio de Janeiro.

Após a morte da vil matriarca, o declínio dos De Chabot Chagas é representado de forma tão ligeira quanto foi na realidade, e, encerrada a transmissão, quando pensam que só resta conhecer a face do industrial, mais uma surpresa: de mãos dadas com seu protegido, em carne e osso e de máscara de palhaço, o antiquário se faz presente na sala, e divulga:
- Senhoras e senhores... meu sobrinho, Antoine Passos de Chabot Chagas.
Cética, Simone pergunta:
- Esse é o sobrinho que eu, carinhosamente, chamo de Bujão de Ipanema?
Trambecando, Jean Paul afiança:
- Esse bambu não pode ser meu filho. Antoine é um rolha-de-poço.
- Não sei como isso aconteceu, mas, esse garoto é nosso filho, sim! – diz Angelina, que o abraça forte, o beija, e especula: - Quem é o mascarado, meu querido? Diga pra mamãe.
- Ele me ajudou quando eu fugi das cinturadas do meu pai; aí...
Nicolau tira a máscara e deixa que todos o vejam, e o impacto é geral.
- Zé? - a adúltera diz: - Pra mim, você tinha morrido em acidente aéreo.
- A senhora tá se confundindo, mãe. Ele é Cecílio Lopes, meu benfeitor.
- Você é rico, Miro? – Silvester indaga ao presidente da De Chabot.
- Ora! Que piada é esta? – ribomba o ator: - Este é o falso Diamantino Vilela.
- Todos estão enganados. – atesta o bebum: - Ele é Guilherme Souto, o Índio.
- Ele é o Índio, Zen, Miro e todos os vermes que se aproximaram de nós. – conclui Maurice, atordoado: - Cadê o nosso dinheiro, seu rato sem limites? Devolva-nos o quê roubou, marginal.
Sem definir se está ressentida com Gabriel, Zen, Índio ou Nicolau...
- Porquê você foi meu amigo e destruiu nossos irmãos? - Simone vasculha.
- Em nenhum momento, eu fui seu amigo. – o caçula rejeitado declara: – Tirei seu marido de você e fui o responsável por seus problemas na gravidez, mas não sou tão insensível quanto a família De Chabot Chagas e me arrependi, perdoei a você e a mim, mas jamais pense que eu lhe poupei porque lhe amo, por que Gabriel é folclore. Eu sou Justino.
- Já entendi que o enfermeiro era ficção, e que você não sabe o quê é o amor.
- Como posso saber, se ele foi me negado pelos meus próprios irmãos?
- Quer dizer que você é meu tio mesmo? – Antoine interroga, beijando-o: - Então, tá explicado porque é tão bom pra mim.

Pra documentar o seu incrível retorno do mundo dos mortos, a exemplo do que fez com Ronaldo, o industrial está gravando tudo, e de cada um escuta uma queixa particular, dando impulso a um rol de reflexões.
- Meu irmão José do Egito tirou meu apartamento e meu restaurante, tirou meu amor e minha vida, decidiu me massacrar por uma doce vingança. Será que você é doente, Justino Nicolau?
- E eu fui te encontrar e acabei seviciado na Suíça, jogado na cova dos leões.
- Ele me tirou a mulher e me jogou na sarjeta, e depois levou a minha casa.
- E eu me isolei naquela fazenda onde nada acontecia; estava virando freira.
- E eu me dei bem, agora sou um ator famoso, protagonista da novela das oito, mas, como diria o mineiro Túlio da Hora, meu primeiro grande personagem, quero deixar claro que não concordo com o jeito com que o senhor conduz o seu jogo sujo, Diamantino Vilela.
O jogador pede para o sobrinho se retirar e, de uma só tacada, testemunha:
- A frieza das paixões não nos deixa ver o quanto é importante olhar para o próximo, porque só sem reino enxergamos que também podemos ser a próxima cria da servidão, afinal, somos todos escravos do prazer.

- Deixe de metáforas idiotas, Casimiro Zen! - disposto a indiciá-lo e reaver seu patrimônio, Maurice acusa: - Você sempre tem dois sentidos para suas mil faces, mas nada justifica esse múltiplo uso de falsidade ideológica.
- Não foi por eu ser doente e ter sido cuspido na cara, quando eu era apenas uma criança querendo carinho, que você perdeu seu apartamento e seu restaurante. Você perdeu o quê tinha por que é volátil e não escolheu bem o seu entorno, tanto que se deixou enganar por Zen, a pantomima da bicha perniciosa, a caricatura que eu criei pra te corromper e te levar a ser um dependente de cocaína, e, por fim, a enlouquecer pra ter de volta o seu idolatrado bofe, seu amor, sua vida, que é tão inconstante quanto você, mas que nunca lhe amou de verdade, pois não passa de um caça-dotes que estava pegando demais no meu pé, o quê me fez providenciar-lhe umas férias na Suíça. Numa jornada descomedida, ele partiu em busca de Casimiro, e eu fiquei mais livre pra dar seqüência a epopéia onde o sangue é azul porque coagulou. Com isso, podemos avaliar que a vingança não é doce, é mais amarga do que se pensa e tem gosto de vômito, de fígado, de bílis.
Jean Paul vomita e, rapidamente, ele aciona a faxineira. E prossegue:
- E, você, meu caro primogênito, é o pior dos jogadores, uma peça de fácil digestão, uma marionete que sucumbiu ao ter a mulher roubada por um feirante agreste e dominador. Você é um homem vergonhoso, que não honrou o sangue de Jacinto Barromeu Chagas, você é um homem vergonhoso que, pelo amor absurdo que sente pela ex-esposa, se entregou ao fracasso e, covardemente, passou a bater em Antoine como se estivesse castigando a piranha cínica, bela e rotativa, que, na ausência prolongada de Zé Pedro, deu pra tudo quanto é funcionário da fazenda.
- Isso é mentira! – Angelina reverbera, achando que está podendo.
O dono da festa aciona um botão no controle e, na tela, é exibido um filme de sexo explícito, editado com o propósito de mostrar, em sessenta segundos, com quantos paus se faz uma canoa; traduzindo: com quantos peões, cocheiros e correlatos ela se divertiu.
- Você tem brilho e atua bem, Angelina. – caçoa o atorzinho medíocre: - Vou indicá-la a uma agência que seleciona o elenco pra esse tipo de trabalho.
- Ed Bastos, - o anfitrião retoma o monólogo, engrenando o escárnio ácido: - para que concorde ou não com o meu jogo sujo, basta eu acenar com algo do teu interesse. Porém, o quê tenho a oferecer-lhe agora é uma péssima notícia: devido a impopularidade derrapante do seu primeiro trabalho na TV, o autor de Espelho Meu já escreveu um trágico desfecho para o mineiro Túlio da Hora. O protagonista de bosta vai sumir de vez da trama, num acidente automobilístico, e Jamil de Montes Claros, interpretado pelo ator Hélio Quintino, surge na trama pra viver o grande herói que consolará e conquistará o coração da mocinha. Posso jurar que isso é verdade, pois, há pouco, eles assinaram contrato diante dos meus olhos, e estão lá embaixo comemorando a dobradinha que já deu certo em Calango Urbano, por isso, eu recomendo que, ao indicar minha ex-cunhada para filmes pornográficos, não esqueça de se candidatar a uma vaga, porque nunca mais alguém lembrará do seu nome na televisão. Mas, acima de tudo, você rebola bem e tem muito mais molejo nos quartos do que Angelina, vai se adaptar com facilidade ao gênero, acredite no seu ex-cunhado.

Ao mesmo tempo, como em um audacioso tribunal sem júri ou juíz, todos reclamam sua condição de vítima e, com palavras que fazem o réu sorrir por dentro, agridem Nicolau, que, por saber que as espetaculosas declarações estão sendo guardadas, os enseja à catarse.
- Conversarei com cada um em particular. Assim, eu não serei fuzilado.

Aceita a proposta, sensatamente, os que aguardam o chamado do maioral vão para o salão de festas, e ele tem a chance de se explicar e de escutar as explicações de Simone e de Jean Paul, mas, após a discussão com Maurice, a fita acaba e Justino é assassinado.

Poucos minutos depois...

Dois seguranças, Antoine e o garçom encontram Jean ensangüentado, chorando, debruçado sobre o cadáver, com a faca do crime na mão e pedindo perdão ao bastardo.
- Porquê você o matou? - pergunta o filho: - Ele era bom pra mim.
Imediatamente, a Polícia Civil é acionada e, sem resistência, o encachaçado é preso em flagrante, e até que um especialista apareça para contrariar o óbvio, ele é o único suspeito formal da Lei.

Ao ver a reportagem sobre a morte de Nicolau, Elton Lins de Maidano, delegado da Leopoldina, mestre em desvendar crimes que não estão na vitrine, liga para o titular da Zona Sul e garante que Jean Paul de Chabot Chagas é um bêbado inocente, causando um reboliço na delegacia do delegado Rogério de Carvalho, que acredita no taco do parceiro, investiga e instaura inquérito onde vários convidados inocentes são suspeitos.

Com o laudo pericial nas mãos, sabendo que a sala tinha três entradas e que Jean Paul estava chumbado, dormindo no banheiro, o quê fez o industrial chamar Maurice para o embate entre almas antagônicas, Sir Maidano, o Sherlock carioca, deduz que outras pessoas estiveram na cena do crime, e inicia a busca por vestígios do assassino. Atrás de uma parede móvel, ele descobre o estúdio de onde tudo estava sendo gravado, e acha a fita.


A pergunta navega na rede e assola a crônica policial da terra do samba: Quem matou Nicolau Barcelos de Magalhães?


Guilherme depõe a favor dos De Chabot Chagas, confessa que participou da vingança de Justino Afonso contra seus irmãos, e que não acha que eles sejam capazes de matar nem a uma mosca.

Apoucado, ele reconquista o coração da sua amada, que descobre que seu amado influenciou ao amigo a deixar sua fortuna em família, para aqueles que não estavam comprometidos com a desdita pela qual passou, o quê o fez nomear Monique e Pablo de Chabot Chagas da Cunha Bastos, e a Antonie Passos de Chabot Chagas, os legítimos herdeiros do império De Chabot.

Pelo MP, Guilherme Souto é denunciado por estelionato e vai preso. Advogado do finado Nicolau, da Piopen Alitelho, a fábrica de brinquedos de Alípio, e da rentável Confecção Chiquinha do Norte, Randolfo Otílio Parente livra o cachaceiro e o dedetizador do xilindró.
- Graças a Deus! – exclama Jean: - Já tava com crise de abstinência.

No Leblon, Jean Paul confessa à irmã que vontade não lhe faltou, mas não sabe dizer se realmente liquidou o vingador. Sábia e protetora, ela acredita que o mais velho é inocente e embarca na hipótese de que procuraram o confundir, fazendo-o assumir a culpa.

Simone não quer, mas desconfia do mais novo dos De Chabot Chagas, pois Maurice sempre foi como a matriarca, e seria bem capaz de cometer um crime premeditado para não perder Silvester. O professor perdeu a companhia de Angelina, o amor próprio e a dignidade, mas foi o empresário quem perdeu o amor, a prudência, o patrimônio e a sanidade mental. Lembrando do pacto que fizeram quando eram adolescentes, de nunca enganar ou ferir um ao outro, ela se dá conta de que foram injustos com o caçula, Justino, não estendendo a ele a mesma paixão, o reflexo de um sentimento que poderia aquecê-lo de todos os males, e acha incorreto Maurice deixar o irmão ser acusado, quando na verdade é o assassino.

Eles se defrontam e, ao que tudo indica, ela não está errada e ele tem alguma culpa, mas, contrariando o quê está na cara que não é o quê não pode ser, e que de fato não é, longe dali, o Sherlock chega a conclusão que o criminoso é Ed, Silvester ou Angelina.

Isentando Jean Paul da suspeita, Maurice convoca a imprensa e, em rede nacional, assume que matou Justino, o que dá uma reviravolta no andamento das investigações, mas, não no labirinto cheio de saídas em que se transformou a mente do Sir Lins de Maidano.

Movendo as peças, Elton começa a jogar no tabuleiro em que Justino foi derrubado, passa a vigiar o ex-empresário e descobre que ele está morando no conjugado de Silvester, na Constante Ramos, onde o caça-dotes faz vida e, estranhamente, o sustenta.

O investigador Tonhão Barata de Castro, um profissional que topa tudo pela Lei, é designado para envolver o prostituto e colher informações que possam desvendar o crime. Disfarçado de Solano, um cliente rico, ele pede pro michê ir ao bar para comprar umas cervejas e planta escutas no banheiro, no abajur e no biombo. Em menos de vinte e quatro horas, o delegado toma conhecimento de que, por ter feito um dossiê comprometedor, Maurice faz chantagem com Silvester, forçando-o a sua presença.

Silvester finge estar arrependido de ter lhe traído, mente que o ama mais que antes e, após o sexo, pergunta onde está o dossiê. Apatetado com a declaração do garotão, Maurice não percebe o engodo e revela que o dossiê está no cofre do apartamento de Simone. O rapaz veste a roupa e diz que precisa sair pra atender um cliente na Barra da Tijuca.

Sem dúvidas de que encontrou o assassino, quando o michê parte pro Leblon, Elton liga para Rogério de Carvalho, que sai em diligência, voando para o desfecho. Os policiais chegam ao duplex de Simone e defrontam-se com Silvester, que já queimou as provas que o incriminavam e está com um revólver apontado pra cabeça de Monique, violência que permanece por mais de doze horas nas emergências jornalísticas, e que é veiculada, simultaneamente, em várias redes de transmissão audiovisual do mundo, o quê faz com que, pra pedir em nome da menininha e viver uns minutos de fama, até os pais, irmãos, tios, primos, avós e vizinhos do rapaz venham de Oswaldo Cruz para o Leblon.

Dramaticamente, Silvester da Silveira Bonfim relata que a paixão está terminando e que não deu fim à vida de Nicolau, matou apenas o surfista Casimiro Bueno, um homem macabro pelo qual se apaixonou, alguém que não existia e por isso o repulsou, um crápula, um personagem que sumiu da trama, assim como o mineiro Túlio da Hora.

Enfim, o destemperado libera a refém e, apontando a arma na própria cabeça, se prepara para se jogar da varanda do oitavo andar. Maurice chega e se apavora, se aproxima e tenta dissuadí-lo, o abraçando e medindo forças para tomar o revólver das mãos de seu menino, mas, antes que a polícia ponha a mão no garotão, a grade de proteção se rompe e os dois caem lá embaixo, diante de uma multidão de curiosos.

Dois anos depois...


Após perceber que esteve na lama pelo amor desenfreado que sentia por Angelina, que não passava de uma cachorra de família rica, e como é do tipo que não sabe viver sem uma costela para amar intensamente, Jean enamorou-se e está bem casado com Almerinda, que efetivamente o ajudou a resgatar o brio. Ela continua sendo secretária da presidência, e o professor de informática renovou o espírito e hoje não tem tempo para bebidas, afinal, trabalha como consultor das indústrias, comércios e companhias fundadas pelo bastardo. O casal já tem um pimpolho, Nicolau Fonseca Chagas, afilhado de Guilherme Souto e de sua irmã, a toda poderosa, pois, como determinava o testamento, caso o industrial viesse a morrer prematuramente, além de obter 1% das cotas e a tutela para administrar os bens e interesses dos herdeiros Antoine, Monique e Pablo, Simone foi nomeada para comandar a De Chabot, até que eles completem maioridade.

Casada, a presidente espera gêmeos, Pierre Louis e Lucian Germain, herdeiros de Guilherme, que não cumpriu nem um terço da pena e já está em casa há mais de seis meses, e que prefere nomes menos afrancesados, menos afrescalhados, como Justino e Jacinto.

Aos quinze anos, Antoine Passos de Chabot Chagas é um menino de ouro que desenha roupas pra confecção de Chiquinha do Norte, empresa para qual também desfila. Magro como palito, o molecão de peso é convidado a aterrissar nas passarelas da Europa, mas sua madrinha e tutora decide que ainda é muito cedo pra um garotinho ficar distante da família.

Na mansão do Recreio, Angelina mora com o filho e continua fazendo de um tudo pra arrumar um bom partido, pois Ângelo deu alguns passos e passou o quê tinha pro nome do neto, a fim de deserdá-la e evitar que sua construtora vá parar nas mãos de aventureiros.

Rejeitado pelos teledramaturgos, Ed é a maior celebridade pornô do momento, atua até no gênero gay, e há quem diga que ele é um canastrão que só interpreta a si mesmo.

No dia da missa de dois anos de morte de Maurice, nascem os filhos da industrial, que, pra conformação geral, são batizados de Pierre Justino e Lucian Jacinto Chagas Souto.

Numa cadeira de rodas, cego de uma vista, sem o antebraço direito, sem parte das pernas, corcunda e com o rosto deformado, subvencionado por um deputado estadual de esquerda, o prisioneiro Silvester da Silveira Bonfim publica Reflexões da Paixão Fria, sua autobiografia, ou melhor, os idílios de seus encontros com um cara que foi Lelé, Nicolau, Zé Pedro, Casimiro Bueno, Diamantino Vilela, Índio, Zen, anjo Gabriel, Cecílio Lopes, fulano, sicrano e beltrano, mas que não conseguiu ser apenas Justino Afonso.

Diz o prefácio do autor:

A vingança é o fim de quem pensa nela; a vingança é um veneno para o mais faminto; vingança destrói mais a quem se vinga. Em suma, a vingança, ao vingador, nada vinga, e esta é a moral da história de um homem de cera que não abdicou dos desejos caliginosos, de alguém que se moldou pra amar e que, se existiu, ninguém viu, porque eu não sei se falo de mim, de Maurice ou de Casimiro Bueno, o único que de fato amei.

No livro, detalhadamente, o sobrevivente explica que, quando entrou na sala do todo poderoso da De Chabot, Maurice confrontava-se com o irmão mais novo, que aproveitou para diminuir aos dois de uma só vez. Na mesa do bolo, uma faca larga e pontiaguda dava pinta de que seria a arma da cena fatal, pois ninguém agüenta ser ferido tanto assim. Maurice o ensejou a matar Justino e o ajudou a montar a cena para incriminar o mais velho.

- O crime não é um creme, e a vingança não compensa. - diria Maidano.
tom.maria@hotmail.com

2 comentários:

Vicente Portella disse...

A trama é interessante. Pressupoe uma exploração dialética do mito. Mas não sou a pessoa mais adequada para julgar textos para TV, pois não os assisto.

Um abraço
Vicente Portella

Gilson Saraiva Alves disse...

Vicente, em particular, este texto caberia mais pro cinema,mas não descarto uma microssérie bem engendrada para esconder a identidade do personagem principal,criando um suspense em torno de suas várias identidades.